A arte de cuidar

setembro 13, 2016
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3 min de leitura

Por Raphaela de Campos Mello:

Anos atrás recebi da editora Record o exemplar de divulgação do livro Devagar, de Carl Honoré. Foi quando conheci a gênese do Movimento Slow. Contrariando o título, disparei na leitura, tamanha a empatia pela proposta de se recusar a urgência do mundo contemporâneo – confesso, minha alma se entende com o vagar, a contemplação dos dias, o tempo próprio dos processos.

Em maio deste ano, o tema reapareceu. Dessa vez, por obra da Slow Medicine. Tive a imensa satisfação de entrevistar, a pedido da revista Bons Fluidos , o Dr. José Carlos Campos Velho, engajado porta-voz desta filosofia no Brasil. Levei comigo muitas dúvidas e perguntas – em face de tema tão palpitante, não poderia ser diferente. Recebi em troca consistência, embasamento, didatismo, entusiasmo e fé. Dr. José Carlos acredita que, a despeito do atual cenário da saúde no país, é possível resgatar a velha arte de cuidar. Com interesse genuíno pelo outro, escuta, cautela, ponderação e sensibilidade. Saber que esta corrente está aos poucos se “infiltrando” na prática médica me encheu de esperança. Saí da entrevista feliz por espalhar a notícia. Nessas horas o jornalismo se apazigua com sua missão de difundir ideias tão caras à humanidade.
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Raphaela de Campos Mello é jornalista freelancer especializada em jornalismo cultural. Encontramos em seu blog Farelos ao Chão este pequeno trecho, retirado de uma de suas crônicas. Uma pequena pausa em um mundo apressado…

“Mas certas tardes, ah, certas tardes não aceitam meu desprezo. Não mesmo. O céu pode estar cinza-aborrecido ou da cor da laranja. O cenário é o que menos importa. Crucial é ouvir o chamado. Ele é senhor quando ordena: “Pare um pouco e esqueça de tudo o que insiste em ser lembrado minuto a minuto, esse calabouço sem porta ou janela, e se ponha a perceber a vida acontecendo em você”.

Deus meu, há uma vida acontecendo em mim, estremeço. Vida esta que passaria em horas mortas não fosse o convite de certas tardes. Então, largo tudo e vou para o supermercado mais próximo, aquele cuja lanchonete faz divisa com a seção de flores. Pra mim, não há jeito melhor de entardecer do que bebendo café e comendo bolo, o mais simplório da vitrine. Tomo as plantas por acompanhantes e ali permaneço.

A mágica acontece invariavelmente entre 16:30 e 17:30.  Nessa hora esvoaçante, desgarrada do tempo, consigo sentir o vagar das ruas, ainda poupadas da impaciência do rush. A brisa encontra a pele. O canto dos pássaros tem a pureza de um acorde bem dedilhado. O coração parece absorver o morno do sol poente. O corpo inteiro reage sorrindo. Estou na cidade, mas tudo ao redor – e lá no fundo – é calma. Só posso concluir que certas tardes me chamam para ver e crer na brandura da paz.”

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