Por Maria Júlia Paes da Silva:
“Senhor, ajudai-nos a construir a nossa casa
Com janelas de aurora e árvores no quintal –
Árvores que na primavera fiquem cobertas de flores
E ao crepúsculo fiquem cinzentas como a roupa dos pescadores.”
“A Associação Italiana de Slow Medicine recentemente iniciou um projeto chamado Montanha Slow. A ideia é refletir o quanto uma caminhada nas montanhas e a (re)conexão com a natureza podem ser positivos para a saúde. O Brasil é um país tropical e plano, na maior parte de sua extensão. Mas temos, embora ameaçado, um enorme patrimônio florestal e provavelmente a maior biodiversidade do mundo. Esta resenha de Maria Julia Paes da Silva, enfermeira e escritora de rara sensibilidade, debruça-se sobre o livro “A vida secreta das árvores”, construindo um olhar a partir do momento de enorme dificuldade que a humanidade e o planeta Terra atravessam e mostrando a maior ferramenta para enfrentá-lo: a solidariedade. Nossas “Florestas Slow” podem representar a metáfora às montanhas, aos mares, às praias, lugares onde estabelecemos as conexões com nós mesmos, com a natureza e com o outro, numa representação do organismo vivo que é o planta Terra, que clama por nosso olhar e nossa proteção. Este é o presente que Maria Júlia nos oferece, enriquecendo nosso olhar sobre a Pandemia.“
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Nesses tempos de pandemia li “A vida secreta das árvores”, de Peter Wohlleben. Engenheiro florestal alemão que apresenta pesquisas recentes sobre o quanto as árvores, nas florestas, são capazes de se comunicarem e de sentir. Começou seu trabalho há, mais ou menos, 20 anos e hoje afirma que as árvores sentem dor, tem memória, vivem com seus familiares e, através das raízes, recebem ajuda das árvores vizinhas. Tudo com pesquisa.
Afirma também que, nas florestas, é normal que elas troquem nutrientes e ajudem as vizinhas em casos de emergência. Como os formigueiros. Aliás…. superorganismos que, muitas vezes, nos passam despercebidos (a não ser quando nos incomodam!).
Fiquei refletindo sobre quanta coisa não vemos. O quanto percebemos a importância e o papel de todos os nossos companheiros “de frente de batalha”: profissionais da limpeza, da manutenção, auxiliares e técnicos que sustentam, que equilibram, como parceiros, todas as instituições que trabalham na manutenção da vida. Braços que ninguém vê.
Porque é tão difícil ver o óbvio, como já afirmava nosso Nelson Rodrigues? Será porque aprendemos a competir antes de aprender a conviver? Será porque não nos apercebemos da heresia da separatividade? Ou ainda, porque os jogos que aprendemos a jogar não tinham o foco no “ganha-ganha”? (Ah! O egoísmo!).
Neste livro, “A vida secreta das árvores”, se aprende que as árvores são seres sociais e compartilham seus nutrientes com as outras pelos mesmos motivos que movem as sociedades humanas evoluídas: trabalhando juntos somos mais fortes. Se uma espécie morre, todo o conjunto fica mais frágil, mais vulnerável.
Será que a pandemia conseguirá nos ensinar que precisamos mudar o valor que damos a essas pessoas, a essas categorias profissionais? Seres da nossa espécie. O ditado popular diz que “após a tempestade vêm a bonança”. Parece-me que a primavera humana é a conquista da consciência. A natureza externa já conquistou a primavera; o ser humano pode conquistá-la também.
Vibro para que valores como solidariedade, empatia, respeito, cresçam nas ações, se fortaleçam, ganhem foco e intenção. Sei, porém, que esse fortalecimento tem pré-requisitos: exige que criemos o hábito de pensar no outro. Todos os outros, nas suas diferenças, singularidades e papéis. Desenvolver a mentalidade de ganhar junto; não ganhar “sobre”. Ganhar “com”. É um treinamento, como qualquer jogo. Diário. Disciplina, persistência, esforço, foco, intenção, vontade.
Desejar e trabalhar para o crescimento de todos. Responsabilizar-se por fazer o seu melhor, a partir das condições existentes. Reconhecer que o, aparentemente, pequeno não é insignificante (hormônios existem em nosso corpo em quantidade muito pequena! Em alguns casos…. felizmente!). A natureza não desperdiça.
Ser grato por “esses braços que ninguém vê” é entender a Unidade e…. amá-la. Se amo, me empenho em promovê-la. Teilhard de Chardin, padre jesuíta, teólogo, filósofo francês, afirmou que algum dia, “depois de dominarmos os ventos, as marés e a gravidade, dominaremos para Deus as energias do amor. E, nesse dia, pela segunda vez na história do mundo, o homem terá descoberto o fogo”
Vamos aproveitar a experiência da pandemia para aprender a agradecer esses profissionais que “quase” ninguém vê, mas que nos dão suporte, nos amparam, acolhem de tantas maneiras. Obrigada auxiliares, técnicos, pessoal da limpeza…. muito obrigada! Nós precisamos de vocês.
O melhor presente que oferecemos a alguém é nossa atenção. Uma atenção sincera é curativa porque afirma a existência do outro. Vida é relação, vínculo. As dificuldades nos propulsionam para outros patamares. Inclusive de consciência. Qual a vida que vamos retomar ao final da pandemia? O que aprendemos? Entre tantas possibilidades, que seja também sermos o nosso melhor, reconhecendo e valorizando, inclusive, esses braços que ninguém vê.
REFERÊNCIA
Wohlleben P. A vida secreta das árvores. Rio de Janeiro: Sextante; 2017.
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Maria Júlia Paes da Silva
Praticante de meditação e de Tai Chi Chuan. Mãe Waldorf. Profa. Titular pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. Gosto de escrever. Último livro escrito: No caminho – fragmentos para ser o melhor (2016, ed. Loyola).
Toda a Natureza fala, por isso ao me levantar agradeço a Deus pelo “Tempo, Vento e Firmamento”, vou até o meu pequeno quintal e falo “Bom Dia” para todas as minhas plantas; quando vejo que uma delas está ficando triste (amarelada), pois não a considero feia, converso e pergunto o que está acontecendo. Parece que ouço ela me contar o motivo e aí passo a dar um pouco mais de atenção. O ser humano hoje em dia encontra-se no mundo robótico, não consegue ver quem está ao seu redor, por esse motivo o adoecimento em massa, por falta de carinho, atenção e até mesmo de apenas uma palavra de conforto. Um abraço.