A Associação Italiana de Slow Medicine criou, por ocasião de sua fundação, o Manifesto da Slow Medicine, o qual propõe uma medicina Sóbria, Respeitosa e Justa. Sóbria, porque fazer mais não significa fazer melhor; Respeitosa, porque os valores, expectativas e desejos dos pacientes são pessoais e invioláveis; e Justa, porque propõe uma medicina de boa qualidade que possa ser oferecida a todos. Já o Instituto Holandês de Slow Medicine elaborou, em 2014, os 10 princípios que regem a prática da Slow Medicine ou Medicina sem Pressa. Há algum tempo vimos pensando na elaboração de uma colaboração do movimento brasileiro em relação aos fundamentos da Slow Medicine e propusemos a criação do que chamamos de seus Quatro Pilares.
O primeiro pilar é o Tempo. Da mesma maneira que o primeiro princípio da Slow Medicine sugerido pela iniciativa holandesa é o tempo, constatamos que o Tempo realmente é um de seus mais importantes pilares. O tempo que o médico dedica ao seu paciente transforma-se em qualidade na medida em que permite interação e conexão entre médicos, pacientes, familiares e cidadãos. O tempo permite a troca de informações entre os protagonistas da relação clínica e uma interação profícua entre o profissional de saúde e os pacientes. O tempo enquanto presença; o tempo enquanto espaço de reflexão e troca de impressões. O tempo para o compartilhamento das decisões. E também o tempo para a análise parcimoniosa das evidências científicas e o tempo tão sábio que ajuda a própria ciência a consolidar suas constantes descobertas. É importante apontar que não falamos apenas do tempo restrito de uma consulta, mas o tempo considerado em sua perspectiva longitudinal, na medida em que esta permite uma convivência prolongada entre o profissional de saúde, pacientes e familiares, gerando laços permeados de solidez e confiança, que permitem tomadas de decisão mais harmoniosas e compatíveis com os valores e as expectativas dos pacientes.
A questão do tempo já aponta para o segundo pilar da Slow Medicine que é o Compartilhamento de Decisões. Nada daquela visão paternalista da relação clínica. As decisões compartilhadas tomam um papel cada vez mais relevante na atenção médica. Para tanto é necessário que o paciente e seus familiares sejam adequadamente informados acerca das decisões clínicas e das alternativas diagnósticas e terapêuticas possíveis. “O compartilhamento de decisões é um processo que exige do profissional de saúde o conhecimento a respeito da realidade do paciente, seus valores e suas expectativas, os quais são utilizados como guia para a proposta de estratégias terapêuticas. A comunicação empática de tais propostas terapêuticas favorece a participação do paciente no processo e aumentam sua adesão a elas. Estratégias individualizadas têm papel importante no enfrentamento do sobrediagnóstico e sobretratamento e seus impactos devastadores na qualidade e nos custos da assistência oferecida. Deveriam ser o novo mantra da medicina .”
Passamos agora ao terceiro pilar da Slow Medicine que é o Uso Parcimonioso da Tecnologia. A Medicina sem Pressa não é, de forma alguma, contrária ao uso da tecnologia. Longe disso, ela propõe um uso parcimonioso, ponderado, cauteloso, adequado e racional da tecnologia. E a tecnologia aqui se refere tanto às tecnologias diagnósticas e terapêuticas como às novas tecnologias da informação, cujo uso exagerado pode diminuir a relação clínica verdadeira em vez de ampliá-la. Sempre afirmamos que a Medicina Baseada em Evidências é o referencial teórico da Slow Medicine, e aqui não é diferente. As evidências em geral nos apontam para a necessidade de uma maior racionalidade na utilização dos recursos tecnológicos disponíveis, visando a uma melhor qualidade assistencial e à sustentabilidade do sistema de saúde (campanhas como a Choosing Wisely e iniciativas como a Cochrane nos mostram isso de forma magistral). Duas coisas são inadequadas: a subutilização de recursos (subuso) e a utilização excessiva de recursos (sobreuso). A Medicina sem Pressa não é uma volta romântica à um passado idealizado, mas sim uma atualização dos pressupostos da medicina hipocrática com os atuais recursos diagnósticos e terapêuticos.
Por fim, o quarto e último pilar da Slow Medicine é a Relação Médico-Paciente. Propomos que os protagonistas da Relação Clínica (termo preconizado pelo bioeticista espanhol Diego Gracia, que sugere uma expressão mais ampla e abrangente para a relação médico-paciente, na medida em que outros profissionais de saúde fazem parte do círculo de cuidados aos pacientes) procurem estabelecer laços sólidos e de confiança que permitam uma troca sincera e desinteressada de informações e o compartilhamento das decisões.
Não é à toa que os pilares da Slow Medicine são em número de quatro. Estes pilares (Tempo, Compartilhamento de decisões, Uso parcimonioso da tecnologia e Relação médico-paciente) foram assim escolhidos para simbolizar a ideia de sustentação e estabilidade que o número 4 empresta a qualquer coisa que se construa, seja uma casa, um templo, um sistema de saúde ou uma relação clínica profunda e longeva, pois acreditamos que esta seja a ideia principal da Slow Medicine e de quem acredita em uma medicina mais humana: estabilidade para enfrentarmos as dificuldades inerentes à nossa existência e os obstáculos na busca por saúde e qualidade de vida.
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Texto escrito por José Carlos Campos Velho, em colaboração com Ana Lucia Coradazzi e André Islabão.
Bom dia ! Eu me chamo Cintia, sou médica oncologista cirúrgica incorporando a slow medicine à minha prática e gostaria de saber se posso publicar trechos deste texto dando os devidos créditos aos autores e link para esta página ( que eu adoro) , no meu site. Obrigada !
Claro, Cíntia! Você estará ajudando a disseminar o movimento Slow! Obrigada!
Muito lúcido e necessário este movimento da Slow Medicine. Eu sou cardiologista e há muito vivemos as pressões econômicas da indústria sobre a prática diária. Sinto falta dessa medicina mais humana e centrada na pessoa e não em suas condições financeiras. Muito obrigada por existirem!
Estou fascinado! Não sou médico, mas um terapeuta que atua em “modo slow”, alinhado ao pilares da cultura slow e do que li aqui na Slowmedicine. Indicarei o ste e as pessoas a todos!
Me identifiquei muito com o movimento. Sou ginecologista e concordo com todas ações. Trabalho no sentido da Slow medicine sem conhecer este conceito, que aplico na minha prática!
Sou partidária de uma medicina artesanal imã medida única para cada paciente !
Sou partidária de uma medicina artesanal imã medida única para cada paciente !
Corrigindo : uma