The Art of Dying Well

julho 25, 2019
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Por Ana Lúcia Coradazzi:

           Morrer. O próprio verbo, por si só, é capaz de causar medo e ansiedade. Vislumbrar nossa própria terminalidade (ou a de alguém a quem amamos), mesmo que apenas de relance, pode ser angustiante a ponto de nos fazer ignorar a única certeza que todos temos em nossas vidas: a de que ela vai terminar. Não temos medo apenas de morrer, mas de morrer mal, morrer em sofrimento, e não deixar para trás nada que valha a pena ser lembrado. A ironia se esconde no fato de que é justamente por nos deixarmos paralisar pelo medo é que aumentamos nossas chances de terminar nossos dias justamente assim: longe do que nos é importante, por vezes mergulhados em sofrimento e solidão.

  Katy Butler usa com maestria sua capacidade de escrever sobre o que é incômodo ou assustador nesse processo, determinada a mostrar outros caminhos para se terminar uma existência de forma mais plena e mais próxima do que merecemos. Às vezes, sua escrita é leve e acolhedora, nos convidando a ser mais tolerantes conosco mesmos e a refletirmos sobre nossas prioridades e valores. Outras vezes, é assertiva e implacável, expondo sem rodeios o quanto somos responsáveis por nós mesmos e pela forma como chegaremos ao fim da caminhada.

Katy não é médica, nem mesmo é da área da saúde (ela é jornalista). Mesmo assim (ou talvez por isso mesmo), é capaz de enxergar e descrever de forma surpreendente a enormidade de atitudes e escolhas que podemos adotar no decorrer de nossas vidas (e não apenas em seus últimos momentos) para tornar o final da história mais sereno e significativo. Utilizando-se de histórias reais, ela não negligencia nenhum aspecto: dos cuidados com a saúde física à escolha das atividades diárias, do estabelecimento de vínculos afetivos ao planejamento financeiro, da escolha dos profissionais da saúde à adaptação da moradia, do desenvolvimento da espiritualidade às questões burocráticas que envolvem o final da vida. Cada detalhe contribui para aumentar ou diminuir as possibilidades de permanecermos o máximo de tempo possível longe de hospitais e UTIs, de precisarmos contar com completos estranhos para as tarefas mais simples, e de morrermos em paz conosco e com os que nos cercam. Ela insiste (com razão) na necessidade de pensarmos mais sobre a terminalidade e efetivamente nos prepararmos para ela, não delegando aos profissionais da saúde ou a nossos familiares a responsabilidade pelos nossos momentos finais. Ela estimula que busquemos relações de parceria com essas pessoas, como é preconizado pelos princípios mais básicos da Slow Medicine.

Seu livro, longe de ser deprimente ou assustador, nos leva por uma jornada que se inicia muito antes do fim, quando ainda temos saúde, capacidade de trabalho, planos e possibilidade de transformar nossas relações. A cada fase, Katy nos abre os olhos sobre o que as pessoas costumam negligenciar e que pode afetar seu futuro. Ela consegue ser incrivelmente prática em suas colocações, mas nem de longe superficial: cada apontamento pertinente nos obriga a repensar nossas escolhas e, quem sabe, mudar de rumo enquanto ainda é tempo. É um livro valioso, daqueles que ninguém deveria deixar de ler.

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Ana Lucia Coradazzi:

Nasci na cidade de São Paulo, mas moro em Jaú, no interior, há muitos anos, com meu marido e minhas duas filhas. Oncologista clínica com titulação pela Sociedade Brasileira de Cancerologia, fiz especialização em Cuidados Paliativos pelo Instituto Pallium, na Argentina. Hoje atuo como oncologista no consultório e na Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP. Também integro a equipe de Cuidados Avançados de Suporte e Medicina Integrativa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em SP. Apaixonada por livros (e escritora nas horinhas vagas), também reservo um tempo para minhas corridas, que mantêm o corpo saudável e a mente tranquila.

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